segunda-feira, 20 de abril de 2009

O papel do educador marxista no interior da escola pública

Qual deveria ser o papel de um educador marxista no seu dia a dia escolar? Seria possível ser marxista por dentro de um sistema educacional controlado pelo Estado burguês? É possível aproveitar as contradições colocadas na escola e fazer destas contradições um espaço de luta em defesa do socialismo? Estas são algumas das questões que inquietam muitos educadores da escola pública comprometidos com a construção da sociedade socialista.
Neste texto tentaremos contribuir com esta reflexão a partir de dois referenciais teóricos, a saber, o liberalismo e o socialismo e suas pedagogias, buscando confrontá-las com o que observamos na prática do dia a dia de uma escola pública. Tomando como princípio a luta de classes, refletiremos sobre qual a opção teórica que o educador (a) desta escola deverá assumir se almeja, de fato, uma nova sociedade.
O capitalismo, agora com sua face neoliberal, aprofunda e propaga o individualismo e a competitividade como sendo os valores mais modernos já encontrado na sociedade e nas escolas. Desta forma incentivando a privatização do ensino, visto que pela lógica da competição somente alguns vencem, portanto os perdedores, que são a maioria, não teriam direito de freqüentar a escola. Tomando conhecimento desta realidade cabe a nós, educadores da educação pública formal, uma tomada de posição. Estamos de acordo com este modelo econômico e este modelo é capaz de garantir a emancipação humana, que é, ou pelo menos deveria ser, princípio fundamental da educação para os trabalhadores?
Para respondermos a esta questão devemos observar a realidade presente no mundo capitalista no qual estamos inseridos. As contradições deste mundo são exorbitantes: nunca se produziu tanta comida e ao mesmo tempo nunca tantos seres humanos passaram tanta fome como agora; temos as mais altas tecnologias no campo da saúde, por exemplo, enquanto muitas pessoas continuam morrendo de doenças comuns que já deveriam estar erradicadas; fala-se tanto em ecologia, proteção ao meio ambiente, porém os mesmos grupos que a propaga são os que mais destroem o planeta com suas indústrias poluentes, agrotóxicos, armas nucleares, automóveis, etc.
Diante de tal realidade nos parece claro e urgente a necessidade de uma transformação radical no mudo. Portanto temos que pensar, enquanto educadores da escola pública, a quem interessa a transformação desta realidade e a quem interessa sua manutenção. Tendo em vista que a escola pública é, por excelência a escola da classe trabalhadora, não temos outro caminho a não ser o compromisso ético de garantir a esta classe o máximo de conhecimento e que este conhecimento lhes possibilitem olhar e interpretar cientificamente o mundo. Temos ainda a responsabilidade de criar espaços de efetiva participação na luta pela construção de um mundo economicamente e socialmente igualitário, pois, somente neste mundo é que teremos a liberdade real do ser humano e a democracia de fato.
A partir desta conclusão, resta-nos ainda a questão de como se deve encaminhar esta luta no interior da escola. Para ajudar em nossa reflexão podemos nos reportar a alguns intelectuais que ao longo da história tiveram esta preocupação e formularam algumas teorias. Nos deteremos em quatro deles, por entendermos que são estes os que mais se aproximam do projeto de educação que defendemos, a saber: Marx, Engels e Gramsci.


Marxismo e Educação

Marx e Engels não desenvolveram uma teoria específica para a educação formal, pois tratavam a questão vinculada à sociedade como um todo. Porém em alguns textos fazem algumas menções à questão da educação para a classe trabalhadora. Uma vez que para Marx e Engels a questão central da humanidade é o trabalho, não poderia desvincular a educação do trabalho.
Marx tinha um conceito bastante amplo de educação, não estava preocupado apenas com a educação escolar, mas com a formação plena do ser humano, o que chamava de homnilateralidade. Marx defenderá que o trabalho para crianças deve ser limitado por lei e permitido somente se combinado com a educação, propondo, inclusive a quantidade de horas de trabalho diferenciadas, de acordo com a idade das crianças. Divide-as em três grupos: dos nove aos doze anos, nesta faixa etária o trabalho não deve ultrapar há duas horas; dos treze aos quinze anos quatro horas e dos dezesseis aos dezoito seis horas.
Quando Marx propõe, em linhas gerais, um modelo de educação para os filhos dos proletários ele tem consciência dos limites que estão dados pela sociedade capitalista. Por isso chama a atenção para o cuidado que os trabalhadores devem tomar com o poder ideológico do Estado sobre a educação. Esta preocupação, Marx explicita na Crítica ao Programa de Gotha, chamando atenção do partido quando exigiam uma educação para o povo a cargo do Estado. Afirma ele “Uma ‘educação do povo a cargo do Estado’ é absolutamente inadmissível. [...] Ao contrario é preciso pelas mesmas razões, banir da escola qualquer influencia do governo e da igreja. [...] é o Estado que precisa ser rudemente educado pelo povo”.(MARX, 2004; p.150-151).

Gramsci e a Escola Unitária

Outro pensador que, assim como Marx, também parte de uma visão de totalidade da educação, é Antonio Gramsci, teórico e militante do Partido Comunista Italiano no inicio do século XX. Gramsci pensa a escola a partir de um contexto social, propondo a chamada Escola Unitária. Neste modelo de escola o trabalho é colocado como princípio educativo e este possui duas dimensões: a intelectual e a física sendo indissociáveis uma da outra, ou seja, “[...] em qualquer trabalho físico, mesmo no mais mecânico e degradado, existe um mínimo de qualificação técnica, isto é, um mínimo de atividade intelectual criadora”. (GRAMSCI, 2004; p.18).
Outras questões centrais trabalhadas por Gramsci no campo da educação são as categorias de hegemonia e intelectual orgânico. Segundo Gramsci “Todo grupo social, nascendo no terreno originário de uma função essencial no mundo da produção econômica, cria para si, uma ou mais camadas de intelectuais que lhe dão homogeneidade e consciência da própria função” (GRAMSCI, 2004; P.15). Ocorre que a sociedade capitalista não vive apenas dos intelectuais oriundos da classe burguesa, ela depende também de formar intelectuais entre os integrantes do proletariado. Isto torna a escola pública, onde estudam os trabalhadores e seus filhos, um espaço de disputa entre a ideologia burguesa e o ideal proletário. A organização da Escola Unitária, segundo o pensamento de Gramsci teria, além da formação para o trabalho, teria também o papel de fomentar a hegemonia proletária fundamentada no conhecimento científico, com objetivo de emancipar o trabalho do jugo do capital. Mas seria possível esta proposta se efetivar na escola publica que temos atualmente no Brasil? Esta questão é de vital importância para o educador formal que se propõe a guiar suas ações pelo marxismo. O entendimento de tal questão pode nos levar a uma atuação mais eficaz na defesa da transformação radical da sociedade e da escola.
Diante do exposto, podemos concluir que, se a defesa e a luta pela educação da classe trabalhadora estiverem ligadas a esta visão ampla da luta de classes, vinculando a escola com a totalidade da sociedade, valerá a pena o dispêndio de energia na defesa da educação. Com a ausência desta vinculação, a luta pela educação para os trabalhadores, que garanta a emancipação humana, tornar-se-á certamente frustrante dado o caráter irrelevante dos resultados que possam vir a ser conquistados a curto prazo.

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